Analisar o Balanço: Parte II
Vamos agora começar a aprofundar um pouco as Demonstrações Financeiras. Neste artigo e nos próximos vamos analisar em profundidade o Balanço, a Demonstração dos Resultados e a Demonstração de Fluxos de Caixa.
No anexo, no fundo desta página, pode fazer o download dos modelos de Demonstrações Financeiras atualmente em vigor para a maioria das empresas em Portugal. Estes modelos são a referência que vamos seguir ao longo deste curso e a base da Análise Financeira.
Note que não vamos explicar em detalhe como se constroem as Demonstrações Financeiras, esse é o trabalho da contabilidade. A nós interessa-nos puramente a análise financeira, o trabalho que sucede à preparação das Demonstrações Financeiras e que apoia a tomada de decisões de gestão e investimento.
Se está interessado em conhecer a fundo as regras da Contabilidade Financeira – requisito que não deixa de ser exigível a um bom analista financeiro – veja o curso com o mesmo nome onde é abordado o Sistema de Normalização Contabilística (SNC) em pormenor e se resolvem inúmeros casos práticos de contabilidade.
Em que partes se decompõe o Balanço?
No artigo anterior vimos uma representação simplificada do Balanço. Na análise financeira, não podemos deixar de ter presente na nossa mente esta estrutura fundamental. No entanto, por si só, ela não é suficiente, temos de ir um pouco mais fundo. Assim, temos como modelo de Balanço o seguinte:
Rubricas |
Notas |
Datas |
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31 XXX N |
31 XXX N-1 |
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ATIVO |
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Ativo não corrente |
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Ativos fixos tangíveis |
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Propriedades de investimento |
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Goodwill |
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Ativos intangíveis |
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Ativos biológicos |
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Participações financeiras |
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Acionistas/sócios |
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Ativos financeiros |
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Ativos por impostos diferidos |
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Ativo corrente |
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Inventários |
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Ativos biológicos |
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Clientes |
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Adiantamentos a fornecedores |
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Estado e outros entes públicos |
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Acionistas/sócios |
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Outras contas a receber |
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Diferimentos |
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Outros ativos financeiros detidos para negociação |
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Outros ativos financeiros |
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Ativos não correntes detidos para venda |
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Caixa e depósitos bancários |
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Total do ativo |
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CAPITAL PRÓPRIO E PASSIVO |
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Capital Próprio |
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Capital realizado |
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Ações (quotas) próprias |
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Outros instrumentos de capital próprio |
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Prémios de emissão |
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Reservas legais |
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Outras reservas |
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Resultados transitados |
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Ajustamentos em ativos financeiros |
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Excedentes de revalorização |
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Outras variações no capital próprio |
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Resultado líquido no período |
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Interesses minoritários |
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Total do capital próprio |
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Passivo |
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Passivo não corrente |
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Provisões |
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Financiamentos obtidos |
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Responsabilidades por benefícios pós-emprego |
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Passivos por impostos diferidos |
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Outras contas a pagar |
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Passivo corrente |
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Fornecedores |
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Adiantamentos de clientes |
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Estado e outros entes públicos |
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Acionistas/sócios |
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Financiamentos obtidos |
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Outras contas a pagar |
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Diferimentos |
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Passivos financeiros detidos para negociação |
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Outros passivos financeiros |
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Passivos não correntes detidos para venda |
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Total do passivo |
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Total do capital próprio e do passivo |
O formato do Balanço é um pouco diferente do anterior. Não só porque está mais detalhado como também porque segue uma representação vertical. Em cima temos o Ativo e em baixo o Capital Próprio e o Passivo.
À direita segue-se uma coluna com notas, sendo que algumas são obrigatórias, em função do tipo de empresa e das regras do SNC, que têm como objetivo fornecer informação adicional sobre as rubricas em questão e/ou sobre as regras contabilísticas subjacentes à mensuração e apresentação dos resultados. As notas são numeradas e explicadas no anexo e é sempre útil ler atentamente essas notas que por vezes revelam informações surpreendentes.
Continuando a leitura à direita, são apresentadas duas colunas com as datas do ano mais recente e do ano anterior. Esta organização permite a comparação dos valores facilitando a análise temporal da posição financeira da empresa.
O Ativo
Duas grandes rubricas dividem o ativo:
- O ativo não corrente (em cima)
- O ativo corrente (em baixo)
Seguimos portanto uma ordem de liquidez: em cima estão os ativos menos líquidos e em baixo os mais líquidos.
Vejamos então o que significam as rubricas mais importantes:
Ativo não corrente
Neste grupo de ativos, encontramos os bens e direitos da empresa que não se destinam a ser vendidos ou transformados no curto-prazo. Têm um carácter de permanência e espera-se que se mantenham ao serviço da empresa durante um período alargado de tempo, sempre superior a um ano.
Deste grupo constam:
- Ativos fixos tangíveis: tais como edifícios e terrenos fabris, viaturas, máquinas e outros bens tangíveis cuja função é produzir ou fornecer bens e serviços
- Propriedades de investimento: são igualmente bens tangíveis, duradouros e com capacidade produtiva mas que não se destinam a ser usados na produção, fornecimento de bens e serviços nem usados para fins administrativos. São bens dos quais se esperam ganhos de capital ou obtenção de rendas. Tipicamente são imóveis
- Goodwill: são ativos intangíveis que representam o valor pago em excesso pela aquisição de uma empresa em relação ao valor dos seus ativos líquidos. Por exemplo, quando uma empresa A compra uma empresa B por 2 milhões de euros sendo o valor do capital próprio desta de apenas 1,5 milhões, A regista goodwill pela diferença de 500 mil euros
- Ativos intangíveis: são ativos não monetários sem substância física, tais como marcas e patentes. Têm de ser identificáveis (podem ser vendidos, transferidos, licenciados ou trocados) e têm de ser controlados pela entidade
- Ativos biológicos: são animais vivos ou plantas que não se destinam a ser aplicados no processo produtivo
- Participações financeiras: são investimentos noutras entidades com carácter de permanência
- Acionistas/sócios: são valores a receber dos proprietários
- Ativos financeiros: são títulos financeiros que não se destinam a ser liquidados no curto-prazo
- Ativos por impostos diferidos: são valores referentes a impostos que a empresa espera receber ou abater a lucros futuros, nomeadamente por conta de prejuízos fiscais passados
Ativo corrente
O ativo corrente regista os ativos monetários ou que são rapidamente convertidos em dinheiro no decurso da atividade normal da empresa. Em situações normais, espera-se que estes ativos sejam convertidos em dinheiro em menos de um ano.
Deste grupo fazem parte:
- Inventários: são mercadorias detidas para venda, matérias-primas ou consumíveis a serem incorporadas no processo produtivo ou
- Ativos biológicos: são animais ou plantas vivos consumíveis ou utilizados no decurso do processo produtivo
- Clientes: são valores a receber de clientes por vendas e prestação de serviços efetuados a crédito
- Adiantamentos a fornecedores: são valores pagos a fornecedores por conta de compras
- Estado e outros entes públicos: são valores de curto prazo a receber ou a descontar do Estado, normalmente pagamentos de impostos por conta
- Acionistas/sócios: são valores a receber dos proprietários da empresa no curto-prazo
- Outras contas a receber: são valores a receber de outras entidades no curto-prazo
- Diferimentos: são pagamentos efetuados por gastos a reconhecer em períodos seguintes, como rendas ou seguros pagos antecipadamente, por exemplo
- Outos ativos financeiros: são títulos ou participações financeiras que se destinam a ser liquidados no curto-prazo
- Caixa e depósitos bancários: são o ativo mais líquido de todos, o dinheiro guardado em caixa ou no banco
Capital próprio
Como vimos anteriormente, o capital próprio é o valor contabilístico da empresa, a fonte de financiamento própria realizada pelos seus proprietários. No capital próprio figuram:
- Capital realizado: quando a empresa é formada, um grupo de investidores junta-se e investe na empresa o seu capital inicial, que posteriormente poderá ser aumentado ou reduzido em função de entradas ou saídas de sócios e/ou aumentos e reduções de capital. O capital próprio é o dinheiro efetivamente pago pelos sócios ou acionistas da empresa para a realização do seu capital
- Ações (quotas) próprias: é o valor das ações (no caso de sociedades anónimas) ou quotas (no caso de sociedades por quotas) da própria empresa que são sua propriedade. Tal como a empresa pode comprar ações ou quotas de outras empresas, também o pode fazer com as suas próprias
- Reservas (legais ou outras): a empresa está obrigada por lei a reter uma parte dos seus lucros anuais e pode livremente decidir reter uma parte maior da exigida. A este valor dá-se o nome de reservas
- Resultados transitados: são os lucros acumulados na empresa que não foram distribuídos aos sócios por via de dividendos nem mantidos em reservas
- Resultado líquido do período: é valor do lucro ou prejuízo do período em questão. Tal como referimos no artigo anterior, este valor é transferido da Demonstração dos Resultados e contribui para aumentar ou diminuir o capital próprio
Interesses minoritários
Os interesses minoritários são o valor da situação líquida das participações financeiras detidas por outras entidades. Se a empresa A adquire 80% do capital da empresa B, as contas da empresa adquirida serão consolidadas e o balanço consolidado das duas é apresentado como se de uma única empresa se tratasse. Os restantes 20%, que são controlados por terceiros, figuram no balanço consolidado como interesses minoritários.
Passivo não corrente
Tal como o ativo, o passivo é desdobrado em duas partes, em função da liquidez das rubricas que o compõem. O passivo não recorrente é menos líquido e assume uma posição de permanência enquanto o passivo recorrente é mais líquido e não deverá figurar no balanço da empresa por mais de um ano em princípio.
No passivo não recorrente encontramos as seguintes rubricas:
- Provisões: são passivos cuja quantia ou tempestividade são incertas. Por outras palavras, isto significa que a empresa tem uma obrigação futura mas não sabe exatamente qual é o seu valor nem estimar precisamente quando ocorrerá. Os contabilistas terão de seguir alguns pressupostos para chegarem a um número que poderão ter de ser revistos periodicamente. Esta é portanto uma área que suscita alguma discussão. Por exemplo, as empresas registam provisões para fazer face a garantias prestadas a clientes, acidentes de trabalho e doenças profissionais ou planos de reestruturação
- Financiamentos obtidos: como o nome indica, são os montantes relativos a empréstimos contraídos pela empresa, cuja liquidação não se espere que ocorra a curto-prazo. O exemplo mais comum são os empréstimos bancários
- Responsabilidades por benefícios pós-emprego: nesta rubrica incluímos os montantes relativos a responsabilidades assumidas pela empresa durante a reforma dos seus colaboradores, nomeadamente quanto a planos de pensões de reforma por velhice ou invalidez
- Passivos por impostos diferidos: registam as diferenças causadas pelas regras contabilísticas e fiscais. Se uma empresa possui um imóvel que contabilisticamente está totalmente depreciado e o vende no mercado por 1 milhão de euros, gera uma mais-valia que será tributada. Ora, a empresa ao verificar a diferença do valor contabilístico e fiscal desse ativo deve reconhecer um passivo pelo valor do imposto a pagar em períodos futuros
O passivo corrente representa as obrigações de curto-prazo. Neste grupo temos:
- Fornecedores: são as quantias em dívida aos fornecedores da empresa por compras efetuadas a crédito
- Adiantamentos de clientes: são os montantes pagos adiantadamente pelos clientes por conta de vendas ainda não realizadas
- Estado e outros entes públicos: montantes a pagar a curto-prazo ao Estado e outros entes públicos. Normalmente são impostos como o IVA e o IRC
- Acionistas/sócios: são os valores dos empréstimos realizados pelos proprietários da empresa, que também se designam por suprimentos
- Financiamentos obtidos: são os valores dos empréstimos reembolsáveis no curto-prazo
- Diferimentos: registam os gastos do período cujo pagamento será efetuado no futuro, como por exemplo, o valor dos subsídios de férias cujo direito se adquire no ano presente mas que só serão pagos no ano seguinte. Registam também os réditos (proveitos) relativos a serviços que irão ser prestados no futuro mas que já foram faturados a clientes
- Passivos financeiros detidos para negociação: regista as quantias de passivos financeiros que a empresa dispõe para negociação a curto-prazo.
Como vemos, o balanço pode ser bastante complexo, principalmente se se tratar de uma empresa de grande dimensão. Nos próximos artigos vamos analisar alguns casos práticos que o vão ajudar a compreender melhor esta peça contabilística mas para já vamos ver em detalhe a Demonstração dos Resultados.