Custeio por absorção ou custeio variável?
O controlo de gestão é mais sobre pessoas do que números (e do que controlo, no sentido estrito da palavra, como se alguém na empresa se encarregasse exclusivamente de controlar os restantes colegas ou a gestão). É sobre o comportamento humano que devem incidir os vários instrumentos e metodologias de controlo de gestão. E se devidamente aplicados, esses instrumentos e metodologias, deverão contribuir para a motivação, a responsabilização e a recompensa de todos os colaboradores na consecução dos objetivos supremos da organização. O sistema de custeio é uma dessas ferramentas de gestão que mais impacto tem na avaliação da performance e que é frequentemente mal compreendido e mal utilizado em muitas empresas pelo que vale a pena revisitar.
O sistema de custeio total ou por absorção
Neste sistema de custeio, impera a lógica de “alocar” custos, de acordo com um determinado critério, a objetos de custo – sejam produtos, departamentos ou zonas geográficas. A ideia é não deixar custos por distribuir.
Tenho visto diversas variantes deste tipo de sistema de custeio. Numa vertente mais industrial, o custeio por absorção afeta os custos industriais diretos, como a mão-de-obra direta, os materiais diretos e os encargos gerais de fabrico aos objetos de custo (por simplificação consideremos como objeto de custo o produto).
Neste sistema, os encargos com as rendas dos edifícios fabris, os seguros, os salários do pessoal de apoio que não trabalha diretamente na produção, assim como outros encargos gerais de fabrico fixos são alocados aos produtos com base nos mais diversos critérios, como por exemplo:
- A quantidade produzida de cada produto
- A mão-de-obra direta afeta a cada produto, medida em número de horas
- O número de horas-máquina empregue a cada produto
Nas empresas que incorporam uma componente de serviços, ou empresas puramente de serviços, costumam ser utilizados critérios de alocação, o número de clientes que consome o produto (que neste caso é um serviço).
Este tipo de empresas utiliza também, em muitos casos, um sistema de custeio que vai além da alocação de custos industriais. Tenho visto empresas a alocar aos produtos custos administrativos e comerciais, que são custos que nada têm a ver com a produção, como os custos com os departamentos de contabilidade e informática, por exemplo.
Este sistema de custeio “super-total” não deixa nada por alocar! Todos os custos da empresa são despejados nos diversos produtos, afetando fortemente a sua rentabilidade.
Qual é o problema deste tipo de sistema de custeio?
As desvantagens da utilização do sistema de custeio total são bastante conhecidas e fico surpreendido que continue em utilização. As principais são as seguintes:
- Ao afetar custos fixos aos produtos com base nos critérios acima expostos, sempre que se lança um novo produto, se descontinua um produto antigo ou se produz um produto temporário, teremos de recalcular as “chaves de alocação”, o que o torna um sistema instável e pouco dado a inovações de produto. Nas empresas de serviços, em que cada caso é um caso, teremos de recalcular a alocação de custos fixos para cada um deles,
- Ora, esta instabilidade traz consigo problemas de comparabilidade de um período para os seguintes. Se a empresa acrescentar um novo produto ao seu portefólio de produtos de um ano para o seguinte, irá distribuir os custos de estrutura por mais produtos, o que a obrigará a reelaborar as demonstrações financeiras do primeiro ano para que sejam comparáveis com as do segundo,
- Por outro lado, se a empresa afeta custos fixos ao produto num determinado período e se não o vende nesse mesmo período, isto é, se cria inventários, estará a colocar esses custos nos inventários que só serão reconhecidos em períodos futuros quando forem vendidos. Neste sistema de custeio, os resultados irão depender mais do nível de inventários do que do volume de vendas, o que poderá conduzir a decisões erráticas,
- Uma outra razão é a distorção do desempenho dos produtos. Se se afetam custos fixos de um valor tal a um produto cuja margem de contribuição seja positiva e que, por essa via, passará a negativa, estamos a distorcer a sua rentabilidade. O gestor poderá decidir descontinuar um produto que é rentável por causa da alocação de custos fixos - o que costuma ser uma decisão errada na medida em que estaremos simplesmente a afetar os mesmos custos fixos aos produtos sobreviventes, conduzindo assim a uma nova distorção da análise de rentabilidade do produto.
Há várias outras razões que poderiam ser apontadas como defeitos do sistema de custeio por absorção. Talvez noutro post me debruce sobre elas. Antes de terminar, gostaria de apontar uma alternativa possível: a adoção do custeio variável.
O sistema de custeio variável pode ser uma alternativa viável
Neste sistema de custeio, afetamos (repare que não digo “alocamos”) apenas os custos variáveis que contribuem diretamente para a produção. Todos os custos fixos, mesmo os encargos gerais de fabrico e principalmente os custos fixos não-industriais ficam de fora do custo do produto.
Dessa forma, a margem de contribuição será mais fiável. A relação entre o custo, preços, volume e lucro poderá ser analisada com mais rigor apoiando decisões importantes como a determinação de políticas de preço e descontos, o lançamento de novos produtos, a realização de promoções de venda, entre muitas outras que têm um enorme impacto na empresa.
Por fim, o responsável por gerir uma linha de produtos sentir-se-á mais motivado se não lhe atirarem custos que ele não controla. Como referi no início deste artigo, o controlo de gestão é muito mais sobre pessoas do que sobre números…